Cicatrizes, cortes, queimaduras… crianças e adolescentes que se mutilam intencionalmente. A automutilação é muitas vezes subestimada. O porquê desta necessidade?
Autolesão ou lesão autoprovocada intencionalmente é qualquer lesão intencional e direta dos tecidos do corpo provocada pela própria pessoa, mas sem que haja intenção de cometer suicídio. A forma mais comum de autolesão é a utilização de um objeto afiado para cortar a pele. No entanto, o termo descreve uma ampla diversidade de comportamentos, incluindo queimaduras, arranhões, bater em ou com partes do corpo, agravar lesões existentes, arrancar cabelos ou ingerir objetos.
Estas lesões praticadas repetidamente não têm a intenção de chamar a atenção, representam antes uma forma de controlar as emoções, ansiedades, raiva, sensação de vazio… uma expressão de grande mal-estar interno, como forma de aliviar fisicamente a dor que é psicológica e emocional.
Em qual fase é mais comum a automutilação?
A grande maioria dos casos de automutilação observa-se na fase da adolescência (etapa de grandes alterações a todos os níveis), pelo que é mais uma razão para os pais estarem muito atentos à expressão emocional dos filhos nesta fase complicada, prevenindo que as intolerantes dores sentimentais e conflitos do cotidiano se silenciem com autoagressões.
“Quando me corto acaba a ansiedade e o drama, então relaxo”. Esta frase é a mais repetida pelos adolescentes entre 12 e 18 anos que praticam o cutting, ou as automutilações. Esta forma de autodestruição é uma adaptação ruim ao estresse ou aos desafios da vida, e é quase a mesma conduta de um viciado que procura consumir para “esquecer”
Na minha prática clínica, já tratei de muitos casos de automutilação e o que se vê é que não conseguem expressar através das palavras a sua dor física ou emocional. A automutilação é uma tentativa de se comunicar, de dizer da dor e do sofrimento apesar da falta de palavras ou da falta de escuta.
Um dos sinais mais peculiares da prática de automutilação é o uso de roupas compridas, mesmo em dias de calor, para esconder as marcas.
É importante, também, ficar atento as mudanças bruscas de humor, hábitos ou horários, pois a alteração de comportamento dos adolescentes pode ser um indicativo de que estão com problemas.
Como é o tratamento para a automutilação?
A abordagem do transtorno por automutilação implica saber, em primeiro lugar, o que há por trás dessa conduta. Pode haver transtornos encobertos (distúrbios alimentares, depressão, transtorno obsessivo-compulsivo, transtorno de ansiedade…). São realidades que somente os profissionais poderão determinar.
Existem várias abordagens usadas como tratamento, geralmente associamos o tratamento medicamentoso com terapias.
A terapia cognitivo-comportamental, por exemplo, é altamente eficaz nestes casos, reduzindo tanto as automutilações quanto as cognições suicidas e os sintomas de depressão e ansiedade. As terapias familiares, as dinâmicas em grupo, as terapias baseadas na consciência plena ou mesmo a terapia comportamental dialética, para aprender a tolerar a angústia, a frustração, a controlar as emoções e a melhorar os relacionamentos com os outros, costumam ser abordagens muito positivas na hora de enfrentar o tema das autolesões.
Portanto, é fundamental que os adultos aprendam a conhecer seus filhos! E ajudem a procurar saídas mais úteis, sensíveis e razoáveis à dor da vida.
Texto: Dra. Jaqueline Bifano